Resenha: Tulipa Ruiz - Dancê



Em seu primeiro álbum de estúdio, "Efêmera"(2010), Tulipa Ruiz nos mostrou o seu pop florestal, que viaja entre uma atmosfera bucólica e uma calmaria típica do interior. Nele, as faixas são carregadas por uma suavidade monótona, daquelas que sentimos nos finais da tarde, como na faixa título "Efêmera", ou dando contornos mais melancólicos, como em "Do Amor" e "Sushi". Por outro lado, mesmo com essa atmosfera suave, o primeiro disco de Tulipa ainda traz faixas com um tom mais energético, como em "Brocal Dourado", e até brinca com sinterizadores em "Pedrinho".

Por sua vez, "Tudo Tanto"(2012), segundo álbum de estúdio de Tulipa, adiciona elementos mais urbanos, deixando o pop florestal de lado. O segundo registro é mais pop, com versos grudentos, como em "É", e refrões mais acelerados, como em "Dois Cafés". Embora "Tudo Tanto" ainda apresente canções mais suaves, como "Ok" e "Desinibida", a novidade aqui são os arranjos mais dançantes que incorporam elementos do groove e do funk norte-americano.

Agora "Dancê", terceiro álbum de estúdio de Tulipa Ruiz, lançado mês passado, é o novo trunfo da cantora. O disco é embalado por um vibe das discotecas dos anos 80 e , dessa vez, dando um destaque maior ao funk americano e a outras sonoridades retrô. Aqui, os arranjos dançantes fazem qualquer um se agitar, com riffs de guitarra cheios de ritmo, versos grudentos e, além disso, instrumentos de sopro que incrementam muito bem os arranjos de cada faixa.

"Prumo" e "Proporcional", primeiras faixas do disco, não perdem tempo e inserem instantaneamente o ouvinte no universo empolgante de "Dancê". Tais faixas já apresentam as notórias influências e elementos retrô dos gêneros norte-americanos que embalaram muita gente nas décadas de 70 e 80, como o funk, e que vão permear boa parte do disco. Além disso, os elementos norte-americanos dividem espaços com os brasileiros, "Tatefá", terceira faixa do disco, parece serpentear por uma sonoridade mais aproximada da nossa bossa-nova, dando um toque refinado ao registro.



O terceiro registro, produzido ao lado de seu irmão Gustavo Ruiz, segue com uma colagem de sonoridades. "Expirou", sexta faixa do disco, brinca com ritmos regionais, trazendo uma guitarra acentuada, um baixo bem destacado e uma percussão em segundo plano. "Virou", por sua vez, consegue ser viciante desde sua primeira audição, com uma letra grudenta e versos românticos, a faixa traz gostosos riffs de guitarras, que criam uma atmosfera praiana e ensolarada, e finaliza desembocando em uma percussão frenética. Contudo, é "Físico" a responsável por um dos momentos mais dançantes do álbum; o flerte com o r&b, a energia do baixo, o sintetizador acanhado e os versos repetitivos, "tudo que eu gosto tá em você/ é puramente físico", são elementos que fazem a faixa mergulhar nas canções pop retrô, como a disco music. Assim, com boas doses de música pop, Tulipa Ruiz apresenta um catálogo viciante, criando no ouvinte a gula por ouvir cada faixa seguinte e dançar sem medo de ser feliz.

Nessa colagem de sonoridades, o desejo de Ruiz por produzir algo mais agitado e pronto para ser trilha sonora das pistas de dança se torna mais concreto, embora é possível observar os primeiros passos dados por ela em adentrar nesse universo em seu segundo álbum. Por isso, é correto afirmar que "Dancê" não seja uma ruptura repentina como o que a cantora já havia apresentado nos registros anteriores, ainda é possível notar semelhanças com os outros dois primeiros trabalhos de sua discografia, principalmente, com "Tudo Tanto".



Por fim, e relembrando os momentos suaves de "Efêmera", o disco finaliza com a melancólica "Oldboy", onde a cantora divide espaço com um saxofone ébrio e reafirma o toque refinado do disco presente desde "Tatefá". "Algo Maior", última faixa, retoma o aspecto teatral que a interprete já apresentou em "Tudo Tanto" e que, também, é muito presente em suas apresentações ao vivo.

Como já havia dito, "Dancê" não soa como uma ruptura brusca com os álbuns anteriores de Tulipa Ruiz. Além de reciclar elementos já trabalhados em seus registros passados, o terceiro disco da cantora parece continuar uma linearidade presente na sua discografia, começando pelo bucólico e manso "Efêmera", seguido pelo urbano "Tudo Tanto", que ainda flerta, em alguns faixas, com a mansidão do primeiro disco, mas já insere arranjos dançantes e acelerados, e, por fim, "Dancê", que abdica totalmente do pop florestal e mergulha em um universo dançante e mais pop, que já vem desabrochando desdo segundo registro. 

Elegante, refinado, envolvente, cheio de energia, objetivo e pronto para botar todo mundo para dançar, é assim que "Dancê" pode se enquadrar - até rimou hahaha -. Tulipa Ruiz, ao lado de seu irmão Gustavo Ruiz, produziu um dos discos mais legais, divertidos e viciantes do ano até agora, caminhando por uma série de referências, ritmos e sonoridades que foram muito bem executados, fruto da versatilidade da cantora e do talento do irmão. Com certeza, você vai ver esse disco nas listas dos melhores do ano em sites e blogs especializados e, claro, isso é merecido. Os dois anos de hiato de Tulipa Ruiz - onde meu desespero por um álbum novo dela só aumentava - realmente valeram a pena. 




Gravadora: Pommelo Produções
Nota: 8.5
Faixas: 11


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